PME reinventam-se
A economia nacional sofreu um revês com a pandemia e algumas pequenas e médias empresas (PME) lutam pela sobrevivência. Mas também são muitas as que estão a conseguir ultrapassar a crise e a enfrentar com resiliência as contingências da atualidade. Neste processo, a transformação digital marca pontos e mostra a sua relevância
O otimismo que dominava no início deste ano a performance positiva das empresas nacionais, com destaque para o papel desempenhado pelas pequenas e médias empresas (PME), sofreu um volte-face nos últimos meses, fruto do impacto provocado pela pandemia resultante da Covid-19. Agora o cenário europeu é de pouco otimismo, como ficou patente nos dados recentemente avançados pela agência Bloomberg, que revelava que mais de metade das pequenas e médias empresas da Europa assumiam que poderiam ter de pedir falência no próximo ano se não recuperassem as receitas. 70% reportaram receitas mais baixas, uma percentagem que, ainda segundo a Bloomberg, subiu significativamente em Itália e Espanha, por exemplo.
Também um inquérito realizado pela McKinsey a cerca de 2200 PME nas cinco maiores economias europeias indicia que uma em cada cinco empresas em Itália e França prevê a declaração de insolvência dentro de seis meses.
Por cá, a resiliência tem sido a palavra de ordem no dia a dia das empresas, com muitas a mostrarem a sua capacidade de adaptação às novas circunstâncias de mercado transformando linhas de produção para novos produtos. Vejam-se os casos de algumas empresas têxteis, que começaram a fabricar máscaras ou EPI (equipamentos de proteção individual), ou das que optaram por produzir álcool gel ou viseiras.
Mas o que representam afinal as pequenas e médias empresas no tecido empresarial português? Muito. São assumidamente o motor da economia, como muitos profissionais as definem, e responsáveis pela maior taxa de empregabilidade nacional. Representam cerca de 70% do PIB e são responsáveis por uma fatia substancial de exportações, que de 2008 a 2018 aumentaram de 28% para 44% do PIB. Os números da Pordata apontam para que, em 2018, fossem, no total (micro, pequenas e médias), mais de 1 milhão e 200 mil.
Apoios à recuperação
Os negócios vivem, sem dúvida, um contexto desafiante, e neste cenário as medidas governamentais, e não só, de apoio às pequenas e médias empresas desempenham um papel fundamental em alguns sectores de atividade. As medidas promovidas pelo Governo para assegurar a mitigação dos impactos económicos, quer de ajuda à tesouraria das empresas, quer na proteção de empregos, passaram, entre outros apoios, pela criação de uma linha de crédito de apoio à tesouraria das empresas de 200 milhões euros; linha de crédito para microempresas do sector turístico no valor de 60 milhões euros; pelo lay-off simplificado; isenção do pagamento de contribuições à Segurança Social durante o período de lay-off por parte de entidades empregadoras, ou ainda reforço da capacidade de resposta do IAPMEI e do Turismo de Portugal na assistência ao impacto causado pela Covid-19.
A pensar na fase pós-Covid, a polémica do momento está centrada no Orçamento do Estado para o próximo ano, segundo alguns muito pouco favorável para o sector empresarial. As dúvidas que se levantam quanto à forma como o Orçamento previsto para 2021 está a tratar as empresas nacionais são muitas entre os players do mercado empresarial. Por exemplo, o presidente da AEP – Associação Empresarial de Portugal, Luís Miguel Ribeiro, frisou publicamente, em meados de outubro, que “praticamente não há novas medidas dirigidas às empresas e algumas propostas são até penalizadoras, ao introduzir instabilidade e maior rigidez na atividade empresarial. São, por isso, provocadoras de um elevado desincentivo ao investimento, e, se forem aprovadas, terão sérias repercussões sociais”.
Transformação digital em rota ascendente
A conjuntura pandémica mostrou que as empresas precisam de se adaptar para sobreviverem ao novo normal e que o trabalho pode ser feito de forma diferente e em qualquer lugar. A realidade dos últimos meses trouxe mudanças para as empresas, para os trabalhadores e para os consumidores e ficou patente que as tecnologias que os servem estão diferentes e que no atual panorama a digitalização passou de um fator de diferenciação a uma questão de sobrevivência. A mudança foi tão impactante que muitas organizações fizeram em poucos meses o que, num cenário “normal”, levariam certamente anos a implementar. E muitos profissionais do sector acreditam que o mundo empresarial que se conhecia até aqui não vai regressar durante algum tempo, e, por isso, as PME deverão adaptar-se ao trabalho numa nova economia, mais rápida e com grande predomínio do digital.
Durante o confinamento, muitas recorreram às diferentes plataformas para acelerar a digitalização dos seus negócios, numa tentativa de sobrevivência. Ou seja, parece não restar dúvidas de que a digitalização dos negócios veio para ficar. Um relatório feito nos últimos meses pelo Facebook, numa parceria com o Banco Mundial e a OCDE, sobre o impacto da Covid-19 nas PME, indicia que, no caso português, 31% das PME têm mais de 25% das suas vendas online e ainda que existem sinais de recuperação económica, ainda que ligeiros: 93% das empresas confirmam que estão em atividade (em maio eram apenas 77%) e 28% afirmam que a falta de dinheiro em caixa é um problema, percentagem que em maio era de 36%.
E-commerce e saúde marcam pontos
As PME que atuam no sector do e-commerce e da saúde têm conseguido viver este período com algum dinamismo. Fruto das novas necessidades, nunca como agora se comprou tanto online nem nunca se criaram tantas aplicações, produtos e serviços ligados à saúde e bem-estar. Vistas como estratégicas numa altura em que grande parte dos negócios físicos fechou portas, as lojas online assumiram-se como a principal alternativa de continuidade. No primeiro semestre deste ano, o desenvolvimento de e-commerce com pagamentos online cresceu 10 vezes, tendo sido o serviço mais procurado pelas PME portuguesas clientes da Páginas Amarelas. A pesquisa desenvolvida por esta empresa de marketing digital junto de uma base de 7500 clientes com website, de vários sectores de atividade, revela também que as atividades económicas que mais aderiram às lojas online foram os restaurantes, as farmácias e as lojas de roupa, seguidas de perto pelas lojas de material eletrónico, pelos salões de beleza e pelos minimercados.
Mais de 70% das PME estão otimistas
A Salesforce, empresa tecnológica de Customer Relationship Management (CRM), divulgou em outubro o Salesforce SMB Trends Report, um relatório focado nas transformações que as Pequenas e Médias Empresas (PME) levaram a cabo para fazer face às alterações de consumo provocadas pela crise pandémica. Apesar das incertezas e instabilidade 22% das PME em crescimento afirmam estar muito otimistas em relação ao futuro do seu negócio, enquanto 50% mostram-se relativamente otimistas.
O Salesforce SMB Trends Report recolheu informações de mais de 2.300 líderes e gestores de PME (a Europa, América do Norte e do Sul, e Ásia-Pacífico), o que permitiu constatar que embora haja otimismo em relação ao futuro, as três principais limitações de crescimento das empresas continuam a ser a manutenção do crescimento financeiro, a capacidade de ir ao encontro das expectativas dos clientes, e a possibilidade de atraírem e reterem o melhor talento.
O relatório revela que três em cada cinco gestores de PME em crescimento afirmam que as restrições horárias ou de operação impostas pelos governos locais ameaçam a viabilidade do negócio (65%).
Perante a incerteza do futuro, 55% dos gestores inquiridos afirmaram que a tecnologia é útil para reforçar as interações com os clientes, 51% utilizam-na no crescimento da sua base comercial. Por outro lado, e embora mais de 65% das PME em crescimento consultadas tenham mostrado a sua a intenção de acelerar o investimento em novas tecnologias devido à pandemia, apenas uma em cada cinco as implementou no negócio, nos últimos seis meses.
Já a adoção e escolha das melhores tecnologias aplicadas aos negócios continuam a obedecer aos mesmos critérios, com mais de 70% das empresas a analisar as tecnologias pela sua simplicidade de utilização, pela fiabilidade do fornecedor e pelo preço.
Ainda de acordo com o relatório da Salesforce, quase metade dos líderes de pequenas e médias empresas em crescimento (49%) está a investir mais na interação com os clientes.